A mobilidade que pesa menos e vale mais
Como a Composs está quebrando o paradigma do aço
O setor automotivo brasileiro vive um paradoxo histórico: enquanto as metas de descarbonização se tornam inexoráveis, seja pelo PROCONVE P8, pela etiqueta de eficiência do Inmetro ou pelos acordos voluntários de neutralização de carbono já assumidos por mais de 40 % das OEMs nacionais, boa parte dos veículos ainda nasce de plataformas que carregam quilos extra de aço, produzem montanhas de sucata e dependem de longas cadeias de suprimento. Cada quilo a mais significa emissões adicionais de CO₂ ao longo do ciclo de vida e, pior, risco regulatório em um ambiente que já discute a próxima fase dos padrões de emissão mais rigorosos que o País já viu. Diante desse cenário, surge uma pergunta crucial: por que continuar moldando o futuro com as ferramentas do passado?
Recentemente conheci a Composs, uma divisão da Frasle Mobility, que inaugurou uma nova fronteira para a engenharia brasileira: peças 60 % mais leves que o aço, produzidas em linhas totalmente robotizadas e com praticamente zero resíduo industrial, e assim se apresenta como a primeira operação latino-americana de compósitos estruturais automotivos em escala.
A Composs surgiu a partir de estudos realizados por pesquisadores do IHR (Instituto Hercílio Randon) e do Centro Tecnológico Randon sobre compósitos estruturais capazes de reduzir peso sem sacrificar performance. Os primeiros protótipos evoluíram para a marca Smart Composites, em 2021, e, dois anos depois, culminaram no lançamento oficial da Composs na Automec 2023.
O que faz dos compósitos Composs um divisor de águas
Os materiais desenvolvidos combinam resinas poliméricas de alto desempenho com fibras de reforço, resultando em matrizes que, além de leves, exibem resistência mecânica e térmica superior a muitos aços de referência. O processo de prensagem a quente dura poucos minutos e não gera aparas metálicas; o excedente de resina é reaproveitado em madeira biossintética, fechando o ciclo de economia circular.
Outros pontos críticos para OEMs e Tier 1:
  • Resistência intrínseca à corrosão, eliminando tratamentos anticorrosivos químicos.
  • Geometrias complexas viáveis sem soldas ou etapas de usinagem.
  • Compatibilidade com pintura e revestimentos tradicionais.
  • Linha produtiva com índices de automação acima de 80%, garantindo repetibilidade dimensional e rastreabilidade full digital.
Entre aço e compósito — onde a competitividade realmente se decide
A transição tecnológica só se consolida se o ganho de sustentabilidade vier acompanhado de viabilidade econômica. Em 2024, a Composs demonstrou que esse equilíbrio já é possível. O suporte de para-lamas fornecido à Iveco, por exemplo, caiu de 17 kg em aço para 5,3 kg em compósito, com custo unitário equiparado graças à automação e à eliminação de sucata. O quadro comparativo a seguir resume os principais vetores decisivos.
Nearshoring e automação: produtividade alinhada à agenda de emissões
A fábrica de Caxias do Sul opera 4 500 peças/mês em três turnos e foi concebida como núcleo replicável. O conceito de nearshoring, instalar células produtivas dentro ou ao lado da planta do cliente, vai além de reduzir frete: ele zera gargalos de supply chain expostos pela pandemia, diminui emissões de transporte (estimativa de 10 % a 20 % de CO₂ evitado na logística interna) e cria rastreabilidade ponta-a-ponta, critério cada vez mais auditado nos relatórios ESG das montadoras.
Projeção estratégica — Composs como resposta às demandas ESG
A adoção de compósitos gera benefícios diretos nas métricas que tiram o sono dos executivos de sustentabilidade:
  • Redução de emissões de escopo 3 por menor massa embarcada e transporte encurtado.
  • Atendimentos às metas de reciclagem e economia circular pelo reaproveitamento de resina.
  • Facilitação de selos ISO 14001 e I-REC pela drástica queda de resíduos sólidos.
Para a engenharia, o ganho de design e a resistência à corrosão traduzem-se em menor custo de manutenção e maior valor residual do veículo. Para a diretoria de compras, a convergência entre custo unitário competitivo e menor TCO destrava decisões que, até recentemente, emperravam em planilhas de payback. E, para a alta liderança, a possibilidade de posicionar o produto como “feito no Brasil, com material de baixo carbono” vira diferencial reputacional em licitações e mercados que já precificam carbono.
Viabilidade econômica — o argumento final que costuma faltar
A barreira clássica aos compósitos era o CAPEX inicial de moldes. A Composs dilui esse desafio ao:
  • Escalar produção em linhas robotizadas que reduzem o custo por peça a partir do primeiro lote.
  • Oferecer modelo de negócios que compartilha investimento de ferramental com o cliente âncora.
  • Alavancar incentivos do Rota 2030 e linhas verdes do BNDES, gerando crédito fiscal e financiamento de longo prazo a taxas subsidiadas.
O resultado é um payback inferior a 24 meses em projetos-piloto — patamar que já convenceu Iveco e atrai negociações avançadas com outras OEMs.
Desafios de adoção — e porque eles não são mais desculpa
Ainda existem gargalos de supply chain de fibras especiais e protocolos de homologação focados em metais. Entretanto, a combinação de nearshoring, automação e parcerias com universidades vem acelerando a curva de aprendizado. Ao mesmo tempo, estados como RS, SP e MG oferecem incentivos de ICMS para produção limpa, criando um ambiente fiscalmente favorável à migração tecnológica.
E agora, romper a inércia ou pagar a conta?
O mercado não perdoa quem chega atrasado à festa da sustentabilidade. Enquanto você lê este artigo, a Stellantis já anunciou que será carbon neutral até 2038, a GM prometeu eliminar emissões até 2040, e a própria Iveco, primeira cliente da Composs, já embarca peças 60% mais leves em seus S-Way. Não é coincidência: é estratégia.
A pergunta incômoda que toda diretoria deveria estar fazendo é: quanto custa NÃO migrar? Porque o preço da inação já tem nome e sobrenome:
Multas regulatórias que vêm aí: O PROCONVE P8 é apenas o começo. A próxima fase de emissões, deve penalizar cada grama de CO₂ excedente, assim como já é feito na União Europeia. Veículos mais pesados = multas mais altas = margem corroída.
Pressão dos investidores ESG: Fundos que movimentam trilhões globalmente já excluem empresas com pegada de carbono elevada. Sua montadora está na lista verde ou na lista negra dos portfólios ESG?
Concorrência desleal dos early adopters: Enquanto você hesita, concorrentes que adotaram compósitos já vendem "veículos de baixo carbono" como diferencial competitivo. Eles não estão apenas economizando combustível, estão roubando market share.
O custo oculto da reputação: Uma única auditoria ESG mal resolvida pode derrubar anos de investimento em branding. Clientes corporativos, especialmente frotas, já exigem certificações de sustentabilidade nos editais. Sem elas, você nem participa da concorrência.
A armadilha do "sempre fizemos assim": Siderúrgicas tradicionais estão presas a ativos bilionários em altos-fornos. Você vai ficar refém da inércia delas ou vai liderar a transição?
Aqui está o dado que deveria incomodar qualquer CEO: a Composs já provou que é possível produzir peças estruturais 60% mais leves, com zero resíduo e custo equiparado ao aço. Se a solução existe, testada e aprovada, qual é a desculpa para não adotar?
A Composs não é apenas uma alternativa ao aço. É a alternativa ao atraso.Se já existe uma alternativa comprovadamente mais leve, mais limpa e mais eficiente, por que continuar fazendo igual?